descrição
dos moliceiros e do moliço, algumas regras e rituais
na ria de aveiro existem algumas ilhas, zonas que se mantêm secas durante todo o ano, dentre estas destacam-se três na zona mais norte: monte farinha, amoroso e testada.
a riqueza das ilhas residia no junco que crescia no seco e no moliço que crescia debaixo de água. na ilha de monte farinha chegou a haver gado, de que se destacava a criação de cavalos.
a ilha do amoroso tinha três sócios, um dos quais era meu tio avô, motivo pelo qual o acompanhei muitas vezes nas viagens que fazia à ilha, para reparações nos canais e manutenção da casa que aí existia e tinha um poço e uma figueira.
para poderem explorar o moliço das zonas submersas da ilha, os proprietários pagavam à capitania uma licença especial, só podia apanhar moliço na ilha quem tivesse autorização dos donos. não havia zonas exclusivas para cada barco, toda a zona submersa podia ser explorada.
ao domingo de manhã, depois da missa, vestindo o “fato de ver a deus”, os moliceiros iam a casa do meu tio, responsável pelas contas da ilha, que os aguardava com uma garrafa de vinho doce e um cálice, enquanto nas mãos segurava um pequeno saco de pano.
cada moliceiro dirigia-se ao meu tio e dizia: sr. césar esta semana foram tantas barcadas de moliço, a tanto cada uma dá…. e punham o dinheiro no saco, bebiam um cálice e iam até casa.
era assim até à hora de almoço: encontros de homens de palavra.
foi com estes princípios que fui criado e de mim fizeram o homem que sou.
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curiosidade
quando em 1923 raul brandão publicou o livro “pescadores”, (obra completa em : http://docs.paginas.sapo.pt/raulbrandao/Os_Pescadores.pdf) o autor da capa desenhou nela um moliceiro, o mesmo se repetiu, pelo menos, na segunda edição. ao querer que a capa fosse apelativa e, não sei se por ignorância, se por motivos meramente estéticos, escolheu um moliceiro para capa de um dos mais bem escritos e estudados livros sobre os pescadores portugueses.
o moliceiro que barco de pesca nunca foi ……