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"O Vislumbre da Eternidade" | Alentejo
Sendo nós criaturas ingénuas e sonhadoras, enfrentamos a incerteza da mortalidade com a convicção de que, ocasionalmente, poderemos obter um vislumbre de eternidade ao testemunhar o sublime.
Acreditando que certos tipos de beleza transportam uma transcendência inquestionável, procuramos o bálsamo que alivia a angústia de não pertencer a lugar algum, tornando mais suportável o nosso medo inato da solidão no cosmos.
Esta noite foi sem dúvida uma noite de alívio...
História:
Tenho um enorme prazer em fotografar locais icónicos e famosos, já que existe primordialmente uma razão para o serem: a sua beleza única e disposição perfeita de elementos naturais, compensando largamente a sua previsibilidade. No entanto, ao longo dos anos, sinto que não existe nada mais prazeroso em fotografia do que procurar locais novos e pouco comuns, em que o esforço e a excitação da pesquisa e exploração torna toda a experiência em algo muito mais intenso.
Passei uma semana inteira nas vastas planícies do Alentejo em Maio deste ano, em busca de novos locais para fotografia nocturna. Apenas existia uma único spot pré-planeado que queria mesmo fotografar, uma árvore milenar e encantadora, mas no próprio local percebi que não era de todo adequada para enquadrar com a Via Láctea, dada a sua orientação em relação ao céu nocturno, pelo que tive que desistir do plano, já que para mim não é uma opção misturar céu e terra capturados em locais distintos.
Assim, o resto da semana foi preenchido com pura exploração, a atravessar estradas infindáveis de terra batida, verificar mapas, cruzar cercas, escapar a carraças, aranhas e toda uma panóplia de insecos, passae toda a noite a fazer experiências fotográficas, adormecer tardíssimo, jantar a horas impróprias, repetindo a experiência todos os dias...
Após muita procura, finalmente encontrei um local incrível que parecia absolutamente perfeito para fotografia nocturna, com três árvores espelhadas perfeitamente posicionadas mesmo em frente do local onde a Via Láctea iria lentamente surgir e rodar durante a noite, sendo que apenas faltava a colaboração dos Deuses do Clima para permitir que a imagem se tornasse realidade.
Depois de uma primeira tentativa falhada, tudo se alinhou de forma perfeita na segunda noite. O típico calor intenso diurno desta época deu lugar a uma noite agradavelmente amena, com ausência total de vento, permitindo que a água ficasse absolutamente tranquila e espelhada, juntamente com céu totalmente limpo. As três horas seguintes foram preenchidas por puro prazer fluído de fotografar, escolher ângulos, experimentar diferentes alturas de tripé e distâncias focais, tentando ultrapassar o desafio de balançar e alinhar as árvores com a Via Láctea, num estado de quase "flow", serenidade, bem estar, uma ocorrência que tem tanto de rara como de essencial nos dias que correm.
Tentei extrair o máximo possível de detalhe do céu, pelo que fiz três exposições consecutivas do mesmo para cada composição, alinhando posteriormente as três imagens no "Sequator", para assim reduzir o ruído e permitir maior detalhe. Como sempre faço, utilizei a poluição luminosa existente como forma de acrescentar tonalidades mais ricas à imagem, tentando sempre transmitir numa fotografia bidimensional a sensação de "espanto" e reverência experienciada sensorialmente no local.