descrição
Éramos demasiado novos mas nem isso nos impediu de colher ventos por debaixo do ventre. Sempre fomos metade carícia e um tanto tempestade, passos desalinhados à saída do tempo, essa galeria onde o perfume cresce do outro lado da luz a apedrejar o corpo e a volúpia. E, todavia, não deixámos de caminhar teatralmente para dentro das horas, por cima dos objetos, para além dos nomes.
O tempo passou ao lado das primaveras que arderam em versos, as linhas assomaram ao rosto, mas nem assim to disse, até porque sabias que eras tu quem levava toda a minha história agarrada à pele, cosida pelo lado de dentro, indiferente ao pus, ao sangue e ao esquecimento. Nada mais precisava de dizer, porque isso bastava para que tudo em mim estilhaçasse à velocidade de um jato desgovernado a abrir rasto nas nuvens, esse lugar único onde nem os deuses conseguem chegar e que os homens ousaram chamar de "amor".
Hoje, somos olhos vazios voltados para uma nova sentença: escassear sossegos e cicatrizar silêncios na grande armadilha para onde atraímos tudo o que não fomos capazes de vencer.